Amores Expressos & Panqueca de Cenoura

O diretor Wong Kar-Wai tem uma coisa com números. Temos as datas de validade nas latas de abacaxi, temos o quarto 2046, temos amigos daquela exata hora em Days of being wild, temos enfim o policial 633 (beijos Dai!) e o 233 em Chungking Express. Talvez porque os números marquem exatos momentos que a gente tem com alguém. Números de telefone, aquele endereço, o dia do aniversário daquela pessoa, uma matrícula da faculdade, um ano que vivemos juntos. Se formos pensar, em tudo temos números e lembrar deles traz uma certa nostalgia. É, isso é Wong Kar-Wai, como as chaves deixadas no café em Blueberry Nights. São as pequenas coisas que significam muito.

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Em Chungking Express (no Brasil “Amores Expressos”) temos duas histórias. Uma do policial 233 chamado He Qiwu (Takeshi Kaneshiro) que frequenta diariamente a lancheria Midnight Express e acaba ficando amigo do dono do lugar.

He Qiwu está visivelmente machucado pelo final de sua relação de 5 anos com sua ex-namorada May. Tentando superar tal fato ele começa a comprar 1 lata de abacaxi em conserva por dia, durante 1 mês, todas com data de vencimento em 1 de maio de 1994. Ele dá um prazo a si mesmo, caso ela não volte até essa data, ele vai tratar de desistir da relação com a ex e esquecê-la.

[blockquote size=”third” align=”right”] Se o amor tem um prazo de validade, então que dure dez mil anos.[/blockquote]

Paralelamente ele acaba conhecendo uma loira misteriosa em uma boate e com ela troca as mais diversas confidências sobre a sua sofrência pela ex-namorada. A loira é vivida pela atriz Brigitte Lin, e em nenhum momento ela revela algo sobre a sua vida.

Porém, as cenas que seguem nos mostram que ela é uma criminosa que trafica drogas, mata pessoas, rapta crianças, envolta em toda uma atmosfera misteriosa, com seu trend-coach muito bem amarrado. Essa relação dos dois acredito que tenha sido colocada ali só para demonstrar a solidão das pessoas, já tão desiludidas com a vida e com o amor.

Aquele momento que parece que não há nada mais a temer, nada tem mais graça, se não se tem o amor.

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Kar-Wai nos coloca dentro de uma Hong Kong pra lá de cosmopolita e ao mesmo tempo, coloca em xeque toda a solidão de seus personagens, mesmo estando em um lugar sempre cheio de muita gente.

As corridas de He Qiwu, onde ele diz que precisa suar bastante para não sobrar água para lágrimas, a impaciência do cão com ele, que parece não aguentar mais ele reclamando de tamanha desilusão, a relação dele com a loira misteriosa que não leva a lugar nenhum, fazem do personagem de Takeshi Kaneshiro um dos mais envolventes (e muitas vezes engraçados) do filme.

Kar-Wai corta dali essa história, pois ele não está afim de nos dizer o que tem que ser feito, nem dar discursos sobre como superar um amor perdido, ele quer mostrar como as coisas acontecem e como as pessoas reagem a elas.

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Então surge uma outra história que começa também na lancheria Midnight Express. Conhecemos então o Policial 633 vivido pelo ator Tony Leung – nosso musoh master se tratando de filmes de Kar-Wai, Tony nunca decepciona.

Policial 633 também está sofrendo por amor. Ele foi deixado pela namorada, uma aeromoça linda vivida pela Valerie Chow. Nas suas idas a lanchonete, acaba por se deparar com a nova atendente do local, Faye (Faye Wong). Ela é sobrinha do dono e tem um sonho muito engraçado (e que não esconde de ninguém): quer conhecer a Califórnia e por isso, ela vive a vida toda escutando a música Califórnia Dreaming, em alto e bom som, não importa se tem clientes ou não para atender.

Faye nutre uma queda pelo Policial 633, que insiste em não querer ler a carta que a ex deixou pra ele na lanchonete. O momento que ele fica frente a frente com a carta é uma das cenas mais bem filmadas do cinema. Kar-Wai acelera o exterior e deixa o ator quase que em câmera lenta, tomando um café. Um momento pensativo, como se o mundo a sua volta não tivesse mais sentido e só o foco de sua dor fosse o necessário. Genial, genial!

Faye, por sua vez, dá uma de Amelie Poulain, ou melhor, como o filme é anterior (1994) ao filme francês (2001), diria que Amelie que se inspirou em Faye. Ela fica com as chaves que a ex deixou junto com a carta e vai a casa do policial limpar, redecorar, dar uma alegria ao ambiente, sem que ele saiba de nada. Ela quer apenas que ele se sinta mais confortável e feliz.

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Kar-Wai consegue fazer uma obra prima para o cinema, que reúne desde uma fotografia memorável, em parceria com Chris Doyle, uma trilha sonora interessante e coerente com cada momento, além das metáforas como as latas de abacaxi, que servem como um marco para resolver a vida, até com as conversas do Policial 633 com seu bicho de pelúcia em casa e também com o sabonete. De forma até engraçada, ele consegue nos passar a solidão das pessoas nas grandes cidades, que apesar de estarem na correria do dia-a-dia, tem uma vida toda pessoal que por vezes não é tão fácil assim quando parece ou, melhor dizendo, ninguém presta muita atenção no outro. Chungking Express é um bálsamo do início ao fim, um dos meus filmes prediletos desse diretor chinês.

Trailer:

No filme não tem panquecas, mas tem uma salada que o Policial 633 sempre vai comer lá. Como eu achei sem graça postar uma salada, resolvi postar uma receita com algo bem saudável que é panquecas recheadas com cenoura e ricota. E panqueca é amor, né, gente, então vamos lá! Adaptei dessa receita da Rita Lobo, e meus amigos, receitas dela sempre dão certo. Pode confiar.

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Panqueca de Cenoura com Ricota

Tempo de preparação: 60 min
Tempo de Cozimento: 30 min
Rendimento: 10 a 12 discos

Ingredientes

  • 1 1/2 xíc. de leite
  • 1 xíc. de farinha de trigo (usei 1/2 integral, 1/2 branca)
  • 1 xíc. de farinha de trigo (usei 1/2 integral, 1/2 branca)
  • 2 ovos
  • 1 colh. (chá) de sal
  • Manteiga ou óleo de canola para untar
  • 2 cenouras médias raladas
  • 1/2 ricota esmagadinha
  • 1 bom punhado de salsinha picada
  • 1 colh. de sopa de manteiga
  • Sal, pimenta do reino a gosto
  • Para o bechamel: 1/2 litro de leite
  • 1 1/2 colher de farinha de trigo
  • 1 1/2 colher de manteiga
  • 1 pitada de sal
  • Noz-moscada e Pimenta do reino

Como fazer?

  1. No liquidificador coloque o leite, os ovos, o sal e a farinha. Bata até que a mistura fique bem lisinha. Deixe descansar por 20 minutos.
  2. Prepare o recheio enquanto isso: rale a cenoura, doure a cebola e o alho picados no azeite, acrescente a cenoura e os demais temperos e por fim a ricota.
  3. Depois do tempo do descanso da massa (e com o recheio já pronto), aqueça uma frigideira antiaderente, de fundo grosso e espalhe um pouquinho de óleo ou de manteiga. 3. Dê uma boa mexida na massa. Levante a frigideira e com a outra, coloque a massa com uma concha média (que também serve de medida). Faça um movimento circular com a frigideira para cobrir todo o fundo. Coloque a frigideira sobre o fogo baixo e, quando as bolhas começarem a aparecer, vire a massa para dourar do outro lado com auxílio de uma espátula de borracha. O processo todo leva menos de 3 minutos por disco. Transfira para um prato, espalhe mais um pouquinho de manteiga ou óleo na frigideira e repita o procedimento, até terminar a massa.
  4. Para o molho Bechamel: Numa panela grande, derreta a manteiga. Junte a farinha e mexa vigorosamente com a colher de pau, por cerca de 2 minutos. Essa misturinha é chamada de roux e serve para engrossar molhos em geral. Coloque o leite gelado de uma vez e, com a ajuda de um batedor de arame, misture bem, até levantar fervura. Abaixe o fogo e deixe cozinhar por cerca de 10 minutos, mexendo de vez em quando. No fim, tempere generosamente com noz-moscada, sal e pimenta-do-reino moída na hora. Truque: se o molho empelotar, bata no liquidificador e volte à panela.
  5. Montagem: coloque umas 2 colheres de recheio na ponta da panqueca e enrole. Depois é só jogar o bechamel em cima e salsinha! Pronto, podemos comer =)
Sobre o autor

Sara

A dona da cozinha.

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