Decisão de partir & Arroz Chop Suey

“Matar é como fumar, só é difícil na primeira vez.”

Analisando historicamente os filmes de gênero Noir, as mulheres geralmente não se saíram muito bem. Elas eram tomadas por crenças misóginas sobre seu caráter moral. Tudo isso criado por autores masculinos da ficção policial. A femme fatale sempre foi demonstrada como enganadora, manipuladora ou promíscua. Na maioria das histórias  é como se ela fosse punida e desprezada por não ter sabido lidar com as  dores e traumas que aconteceram em sua vida – geralmente causadas pelo patriarcado.

A imagem estereotipada da femme fatale sempre usa o sexo/sedução como um meio de enganar, ter o que ela quer. Isso nos leva a pensar que é a grande vingança dela sobre tudo que viveu até ali.

Lady Vengeance (2005)

As personagens femininas nos filmes do diretor coreano Park Chan-Wook vão na linha contraria disso. Apesar de terem passado pelos traumas e dores por algum motivo, elas usam isso como empoderamento. Ao invés de criminaliza-las, ele as mostra como heroínas. Relembrando as protagonistas de  Lady Vengeance e The Handmaiden conseguimos entender bem por onde a mente de Park passeia ao formular as identidades de suas personagens femininas.

Precisamos falar da beleza plástica do filme. A direção de fotografia de Ji-yong Kim é impecável. Em uma entrevista para a Vanity Fair, Park conta alguns pontos interessantes da fotografia, e de como ele e Kim estavam totalmente conectados para fazer com que cada cena tivesse o impacto visual que eles queriam. Aconselho a ler a entrevista após ver o filme, pois contem alguns spoilers.

Depois de toda essa introdução, vamos ao filme?

Em Decisão de Partir temos Jang Hae-joon (Park Hae-il), um detetive obcecado e exausto, que começa a trabalhar em um novo caso: um homem foi encontrado morto, depois de cair do topo de uma montanha. Ele observa com atenção todo o cenário: roupas caras de escalada, acessórios com as iniciais gravadas, o que leva ele a pensar que aquele era um aventureiro já experiente. Quando se depara com a esposa do falecido – Song Seo-rae (vivido pela belíssima atriz chinesa Tang Wei – de Lust, Caution), na delegacia para um interrogatório inicial, ele simplesmente congela. Aquela mulher tira ele do prumo de alguma forma.

Ela é chinesa, jovem e bonita. Para que consigam se comunicar, ela usa o artificio do tradutor do celular, já que, ele é coreano, e todos estão na Coréia, e ela ainda não aprendeu a língua local. Isso nos remete a um certo distanciamento que tem que ser vencido e onde muito pode ser escondido também, já que a comunicação é precária.

Temos aqui claramente um romance. A química dos dois atores é o crème de la crème, a escolha do elenco foi sensacional. Porém, não temos um caso de amor tradicional, com beijos, abraços e pessoas nuas aconchegadas. Temos sim uma coisa no ar. Quase um sufocamento, tamanha a energia que circula entre os dois. Aos poucos, a investigação sobre a morte do marido vai se desenvolvendo e a cada momento, vemos o detetive lidando com o que ele está sentindo, em contraponto ao que ele acreditou a vida toda como certa. Ambos sabem que aquele “relacionamento” não é legal, afinal, ele é um homem casado e ela é a suspeita que ele investiga. Não sabemos até que ponto eles estão se enganando ou enganando a eles mesmos.

O filme flutua entre passado e presente, fazendo com que a gente veja a vida cotidiana de Hae-jun praticamente como um fardo que é deixado de lado. Aquela velha história da ausência ou falta de “frio na barriga” de uma paixão, que faz com que as pessoas se desinteressem por sua relação duradoura. O detetive passa madrugadas em tocaias, vigiando seus suspeitos, como se não tivesse uma vida familiar. Talvez ele esteja apenas fugindo de sua realidade, ao invés de tentar mudá-la, pois isso demandaria enormes decisões.

Como em In the Mood for love (de Wong Kar-Wai) temos aquele amor que nunca se consuma, mas que existe nas entrelinhas e gestos. No filme de Park, o uso das gravações diárias em seu AppleWatch, revelam o quanto existia de sentimentalidade naquela mulher, sobre as dores e inseguranças, assim como também, grandes revelações. As mensagens deixadas por ele em sua caixa de mensagens do telefone também passam a revelar fatos importantes. O uso dos aparelhos eletrônicos, quase como um amigo, para quem você confessa as coisas e conversa suas mais intimas histórias, nos traz uma sensação de solidão. É preciso dizer, mas não se tem a quem.

Uma reflexão final: as mulheres nos filmes de Park escolhem enganar para escapar das dificuldades, mas quando você se encontra em uma historia como essa,  que outra escolha você tem?

“No momento em que você disse que me ama, seu amor por mim acabou. E no momento em que seu amor acaba, o meu começou.”

Em uma ótima cena do filme, quando eles começam a ficar mais “íntimos”, ele resolve cozinhar para ela. A única receita que ele diz conhecer da culinária chinesa é um arroz com ovos. Por isso essa é nossa receita de hoje.

Arroz Chop Suey

Ingredientes:

  • 2 colheres (sopa) de óleo
  • 2 ovos
  • 1 cenoura média picada
  • 1/2 xíc. de ervilhas congeladas
  • 1/2 xíc. de presunto picado
  • 1/2 xíc. de cebolinha-verde picada
  • 2 xíc. de arroz já cozido

Modo de Fazer:

Em uma panela média, coloque 1 colher do óleo e leve ao fogo alto para aquecer.

Junte os ovos, previamente batidos e vá mexendo sempre, por 1 minuto, ou até mudar de consistência e estar totalmente cozido.

Retire da panela e reserve.

Na mesma panela média, aqueça o óleo restante em fogo alto. Junte a cenoura e refogue por 2 minutos. Acrescente a ervilha, o presunto  e refogue por mais 2 minutos.

Adicione a cebolinha, o arroz e o ovo, e misture delicadamente.

Retire do fogo e sirva em seguida.

Sobre o autor

Sara

A dona da cozinha.

2 Comentários

  1. Amiga…
    Adoooro esse arroz, me deu vontade de fazer hahahaha
    E quanto aos filmes chineses, coreanos, preciso assistir, você sempre fala e eu nunca vejo, mas parecem excelentes!
    Darei novas oportunidades em 2023 hahahaha

    Beijãozão

    1. amiga, veja, aposto que vais gostar =)

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